sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

MINEIRINHO

Era um criminoso. Um homem bem ruim, daqueles que outro homem não conseguiria perdoar. Talvez nem ele mesmo conseguisse perdoar-se. E foi na correria, fugindo da polícia, daquele policial em fúria, pelo que ambos sabiam ser o pior crime do mundo, que Mineirinho morreu. Mas ele, antes, correu, correu muito, sem saída, já clamando a Deus que desse-lhe o perdão que nem ele mesmo podia. Mineirinho corria e chorava. Foi pelas costas que o tiro chegou, bem no meio das costas. Caiu de cara na poça d’água – era tarde de tempestade, eu ia me esquecendo de dizer. E o policial, antes que se afogasse, quis olhar no seu rosto, pra, quem sabe, chutar sua cara e atirar mais umas dez vezes. Aproximou-se, desafogou-lhe a cara da lama, a tempo de olharem-se longamente nos olhos um do outro. Perderam-se naquele olhar. O crime já era o mesmo – a prepotência, a incapacidade de perdão, a ira. Foi quando percebeu que a poça d’água-lama era apenas espelho. E Mineirinho ele mesmo era. Mineirinhos eram ambos. Mineirinhos, naquele momento, de apenas um tiro e olhos nos próprios olhos, morreram. E é assim que escrever pode mudar as coisas, Clarice. E você mudou muitas, ao menos em mim.

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