(para Mário Quintana)
Carmo do Paranaíba, maio de 2005.Meu caro Mestre,
devo e preciso agradecer toda força e empenho em superar tuas míseras dificuldades discursivas e expositivas para dedicar-me tão satisfatória resposta. Veio, de fato, suprir a urgência que eu tinha destas simples, porém intensas palavras. Meus gritos andavam mudos e perdidos em tamanha emoção. A posteridade possui, deveras, o dom de minguar minha já pequenina existência. E o pouco que resta de mim não tem conseguido transcender meus limites a ponto de desabrochar em versos tão imensuravelmente radioativos. Ainda assim, minhas verdades continuam vivas e crepitantes, aspirando momento e fôlego oportunos para se universalizarem, quase tão pretensamente apócrifas quanto as tuas.
Tuas linhas aborreceram-me, porém eu não as rotularia entediantes: acenderam em mim fogo e audácia nunca antes sustentados por minhas mãos trêmulas. Afinal, acostumei-me à ingenuidade em crer que cada poesia tem maneiras, motivos ou fundamentos literariamente palpáveis ou dizíveis.
E, talvez por isso, eu tenha tentado discutir contigo essa tal literatura. Não havia percebido que os grandes não o espalham aos quatro cantos: deixam em paz a poesia, amam-na baixinho, pois conhecem toda a força de sua brevidade. E, mesmo aos sussurros, conseguem mantê-la segura – como se somente os verdadeiros poetas pudessem entender a metalinguagem: a explicação do inexplicável, o alcance do inatingível. A poesia é, enfim, um tesouro sem excessos, o mais belo de todos, dotado de um parasitismo quase tão ininteligivelmente profícuo quanto a própria vida.
É por tudo isso, meu Mestre, que ainda temo entregar-me completamente ao sádico hedonismo de meus versos. Esta freqüente luta por vezes enfraquece-me e faz-me querer desistir da estimada bênção poética. É, no entanto, meu mais atraente desafio: conseguir, daqui a vinte anos, escrever tão pálida ou expressivamente quanto faço hoje, aos dezessete. E os truques da moda sim, que desconfiem da aparente efemeridade de tantas entrelinhas!
A métrica tem sido a explicação mais formal, plausível e lógica para o perfeccionismo de um genuíno poeta em relação aos próprios versos. É, não a causa, mas o resultado racional - mais ainda, matemático - de todos os cortes contorcionistas por que o poema passa até a sua conclusão: o soneto só tem dois quartetos e dois tercetos porque, conservador e inabalável, se sentiu melhor assim. Já os versos livres são iconoclastas infatigáveis dançando, frenética e pornograficamente, um tango lexical. Ambos conseguem, assim, transbordar, lenitivos, as essências líricas de seus respectivos eus.
Toda a confluência que tenho experimentado apresenta-me grandes amigos. Amigos que sempre estiveram comigo. A quem, aos poucos desembrulho. E desembrulho-me. E, se a ti respondo, é porque respondo, assim, a todos eles. Obrigada, meu caro Mestre. E apareça-me sempre.
2 comentários:
Me encantei com as palavras escritas e as cantadas. Gratidão!
Obrigada, Lu. Obrigada mesmo!
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