sábado, 1 de janeiro de 2011

JARDINEIRO

É que renascer, desabrochar assim, amor, à mercê das mudanças do tempo, das tempestades intermitentes com sóis escaldantes, aterroriza, às vezes. Dá vontade de voltar pra debaixo da terra e ser semente de novo, ser pó, ou mesmo retroceder no tempo e me elevar no comodismo daquela árvore troncuda, extremamente frondosa, embora cotidianamente agredida pelas mudanças das estações e pelos transeuntes que por ela passavam, usufruindo de sombra, de encosto, de lascas, de força para apagar brasa de cigarro e consumir chorume de lixo. Era uma árvore adulta, menino, era doente e  doída, mas disso era grande e forte. Impunha-se, ao menos.

E agora... que a árvore finalmente sucumbiu, se espatifou na terra, pediu arrego, vem você arejar, regar, drenar, cuidar assim, tão doce e calmamente, de mim-grãozinhos-de-terra, contemplando pacientemente o florir do eu-seu-jardim, que tão orgulhosa e generosamente você apresenta e entrega ao mundo, já sabendo que minhas cores, texturas e odores simplesmente despertencem - ou pertencem apolineamente a quem queira contemplar. Desculpe, querido, então, se às vezes me recuso, dou trabalho, murcho, volto a querer ser terra. É só medo de um dia ficar sem meu jardineiro e alguém passar por tudo o que renasceu de nós pisando... e o que seria de mim agora, sem você?

Tudo isso só pra dizer, bem brega, que eu amo você do tamanho de trocentos infinitos universos ao cubo e que esses são apenas alguns dos porquês.

2 comentários:

Morcego Vermelho disse...

Lindo demais!
E a semente se completa ao transformar-se em árvore, que produz as flores e frutos que virarão sementes, cada qual negando-se individualmente pela transformação e, ao mesmo tempo, afirmando-se pelo seu necessário devir.
Sem ser reducionista, isoladamente ora somos um, ora outro. Mas, ao contrário da árvore, não nos bastamos sozinhos.
Grande abraço e um 2011 bem bacaninha.

Lívio disse...

Bonito, Gabriela. Parabéns.