domingo, 16 de agosto de 2009

VINTE ANOS

O meu ideal de festa é convidar todo mundo que já passou pela minha vida.
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A primeira professora, as cantineiras da primeira escola, aqueles primeiros coleguinhas que eu nunca mais vi, e os que eu continuo vendo até hoje... a babá que cuidou de mim até os meus quatro anos, as mulheres que ajudaram minha mãe a cuidar da casa, deixar a casa limpinha, e a cuidar de mim e do meu irmão, pra que ela e meu pai fossem tranqüilos para o trabalho... todas as minhas professoras e professores, que deixaram em mim um pedacinho de mundo, de qualquer maneira elaborada - do ensino fundamental, passando pelo ensino médio, até a faculdade... os meninos com quem eu jogava bola na escola, na frente de casa ou no meio daquela rua, mesmo sendo carta-branca - ou café-com-leite, como queira.
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Aqueles colegas que viraram a cara pra mim e me deixaram sozinha pra que eu aprendesse que a solidão nem é tão ruim assim quando se aprende a lidar com ela. Outros que riram de mim quando eu não fui ou agi exatamente como esperaram. Aquela senhora, que eu nem conheço, que sorriu pra mim num dia em que eu briguei com a mamãe antes de ir pra escola - tinha tudo pra ser o pior dia do mundo, mas ela sorriu pra mim.
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Os meus primos e uma amiguinha, vizinha da vó, que faziam das minhas férias os melhores dias da minha vida... os meus avós, que me deram e até hoje me dão lições de vida, de amor e de enfrentamento, que me contaram e contam as lindas histórias das vidas deles e me fazem sentir a pessoa mais nova do mundo, ainda com tanta coisa pra ver e viver. Os meus tios e tias, especialmente a minha duplamente madrinha, por estarem presentes, pelas festas de família, pela amizade, pela colaboração, pela presença, pela existência.
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Os funcionários da escola da minha adolescência, que agüentaram, não me pergunte como, as minhas crises de rebeldia sem causa... aquele leiteiro que passava de carroça toda manhã em frente a minha antiga casa, vendendo sempre dois litros de leite. Às vezes ele até passeava de carroça comigo e com meu irmão - era o máximo passear de carroça.
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Os rapazes por quem eu me apaixonei e fizeram de alguns dias os mais especiais e inesquecíveis. Aquele do primeiro beijo, que nem sabe que foi o do primeiro beijo... o primeiro namorado... aquele outro que me fez chorar minha vida quando não se esforçou pra que desse certo... aquele que foi embora, obedecendo às imposições do tempo e da distância... aquele que está sempre por aqui, derretendo meu coração, mesmo sem acreditar que merece. Aquele amigão de infância que nunca desconfiou de nada e talvez nunca saiba que foi ele quem me ensinou o mais puro e refinado amor.
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Uma amiga que eu fiz lá na infância que, do jeito dela, me ajudou a enfrentar aquela solidão que os outros coleguinhas impuseram. Os moleques da adolescência que se reuniam comigo lá em casa pra estudar, lanchar, falar tudo e nada e compartilhar comigo a alegria de estar bem acompanhada. As amigas que me ouviram e filosofaram comigo as coisas mais importantes de cada fase por que passei até hoje. Todos que se preocuparam com as minhas importantes crises de depressão, mesmo achando que não pudessem fazer muita coisa. E, do jeito deles, fizeram.
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Aqueles amigos que me mostraram boa música e despertaram em mim a paixão por ela. Especialmente aquela que passava grandes tardes de sábado cantando e tocando violão e teclado e me ensinando um pouco de tudo o que eu ainda tenho vontade de aprender. Ela que descobriu comigo a sinestesia, a sensibilidade e a possibilidade de ser mais feliz, mesmo diante de algumas peças que a vida insiste em pregar.
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Os ex-alunos, ex-colegas e ex-patroa, que me ensinaram e viveram comigo a experiência do primeiro emprego.
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A psicóloga que me acompanhou durante dois anos, me mostrando quem eu realmente sou e o que eu posso ser. Os médicos que cuidaram de mim quando minha saúde não estava lá grande coisa.
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As amigas e amigos da faculdade que têm compartilhado comigo os grandes momentos da difícil tarefa de crescer. E, claro, aqueles estudantes que, durante os breves tempos do cursinho, fizeram a alegria dos meus dias - alguns deles presentes até hoje. E a linda família que construímos dentro do pensionato em que morei nessa época.
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Aquela melhor amiga que, apesar do tempo e da distância, continua sempre comigo, mesmo que a gente esqueça os aniversários uma da outra de vez em quando. Essa amiga que comigo fala de poesia, de MPB, de sexo, solidão, alegria, tristeza. Ela que tem liberdade de brigar comigo às vezes, que nem mãe mesmo, e vice-versa. E aquele outro que anda conquistando o mundo, fazendo um elo lindo entre o nosso mundo mineirinho e o mundo metropolitano.
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Os amigos das farras e confidências, daquele certo porre, que cuidaram e cuidam de mim e me ensinam, todos os dias, a alegria de viver.
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Ah! E os pais de todos esses amigos que, tantas vezes, me adotaram como filha, me receberam em suas casas e me fizeram sentir visita ilustre.
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Os amigos da internet, que talvez eu nunca chegue a conhecer pessoalmente, mas que me fizeram companhia em momentos incrivelmente importantes.
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E os meus queridos poetas, amigos, companheiros, autores das perguntas e das respostas mais pertinentes e oportunas de que fiz, faço e sempre farei uso. Eles que tantas vezes salvaram minha vida, equilibraram minha emoção e me colocaram de volta nos eixos.
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A moça da banca de revista da universidade, que sempre conversa comigo e me avisa quando chega alguma revista nova promocional. Que sorriso e simpatia bonitos ela tem. Também os funcionários do restaurante da universidade, que sempre me atendem com um sorriso, inclusive aquela senhora que, certa vez, não resisti e abracei. Os funcionários no xerox, que estão sempre prontos e fazem o trabalho deles pra gente com a maior boa vontade e eficiência e, nas horinhas de folga, até batem um papinho agradável.
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Os motoristas e cobradores dos ônibus que eu tenho de pegar todo dia pra ir à universidade. Talvez eles não tenham idéia de como aquele "bom dia” matinal faz toda a diferença. A vizinha do marmitex, que salva o nosso almoço todo dia em que todo mundo chega em cima da hora, salivando de fome. O pessoal das padarias lá perto de casa, que sempre atende a mim e à minha família com pão quentinho, bolo de coco e bom humor, e até sabem os nossos nomes.
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E, finalmente, a minha família, por me amar e me aceitar incondicionalmente, por saber tudo o que só uma família sabe que acontece numa família. E, claro, a minha segunda família, aquela de olhinhos puxados, que esteve presente desde a minha infância e, hoje, apesar da distância e de, às vezes, algum tempo de ausência física, continua deixando em mim os maiores ensinamentos de fraternidade, cooperação e boa vontade de que posso me lembrar.
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É essa a festa dos meus sonhos, a festa da minha vida. Pode ser hoje, amanhã ou depois. Pode ser no meu último dia. Ou no dia posterior. São essas as lembranças, as pessoas e os momentos que quero e vou guardar pra sempre comigo. Na memória e no coração.
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Obrigada, Deus.

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